por Rodrigo Batista - 3 Comentários

Quando Alexandre Silveira, Ministro de Minas e Energia do Ministério de Minas e Energia participou da assinatura de um Memorando de EntendimentoPequim, China com representantes da Raízen Energia S.A. e da SAFPAC Ltd., o clima era de otimismo cauteloso.

Contexto da transição energética brasileira

O Brasil tem sido, desde o programa Proálcool dos anos 70, um dos maiores produtores mundiais de etanol. Hoje, com a expansão da chamada segunda geração – que transforma a bagacilha da cana em bioenergia – o país ganhou um trunfo extra: a capacidade de gerar Sustainable Aviation Fuel (SAF) em escala.

A delegação presidencial, liderada por Luiz Inácio Lula da Silva, chegou à China em maio de 2025 para discutir energia limpa, parcerias comerciais e a meta de reduzir a dependência de combustíveis fósseis.

Detalhes do acordo e metas de produção

O documento assinado não cria obrigação de compra imediata, mas estabelece três fases claras de desenvolvimento:

  • Fase 1 (2025‑2026): produção de 170 mil toneladas de SAF por ano.
  • Fase 2 (2027‑2029): aumento para 285 mil toneladas anuais.
  • Fase 3 (2030‑2033): pico de 500 mil toneladas ao ano.

Esses números são ambiciosos, mas não aleatórios. Eles respondem a projeções da ICAO (Organização da Aviação Civil Internacional) que apontam para uma necessidade global de 2,5 bilhões de toneladas de combustíveis sustentáveis até 2050. O Brasil, com sua base de etanol, pretende cobrir cerca de 2% desse volume só com o projeto em questão.

A tecnologia chave é o chamado Alcohol‑to‑Jet (ATJ), que converte etanol – inclusive a segunda geração proveniente da bagacilha – em querosene de aviação de baixa emissão. Segundo o Ministério, o processo tem eficiência de cerca de 70%, o que coloca o Brasil à frente de concorrentes que ainda dependem de óleos vegetais.

Reações e declarações dos envolvidos

Reações e declarações dos envolvidos

O ministro Silveira ressaltou ao final da cerimônia: “O Brasil tem posição de destaque no cenário global da transição energética e está preparado para liderar soluções sustentáveis no setor de transportes. Esta parceria demonstra isso: o valor estratégico do nosso país, do etanol brasileiro e da nossa tecnologia para a descarbonização da aviação em escala internacional, bem como demais setores.”

Já o CEO da Raízen, Pedro Reis, comentou que a iniciativa “é o próximo passo lógico após consolidarmos o etanol como combustível rodoviário. Agora, vamos colocar o Brasil nos céus.”

Por sua vez, a diretoria da SAFPAC Ltd., representada por Ming Huang, destacou que a empresa já possui projetos piloto em Hong Kong e Cingapura, e que o acesso ao etanol brasileiro seria “um divisor de águas para acelerar a adoção do SAF na Ásia‑Pacífico”.

Impactos para a aviação e o mercado asiático

O continente asiático, com seu rápido crescimento de tráfego aéreo, está sob pressão para cumprir metas de carbono cada vez mais rígidas. Países como a Coreia do Sul e o Japão já anunciaram “taxas de carbono” para voos domésticos.

Com o acordo, a expectativa é que companhias como a China Southern Airlines e a Singapore Airlines passem a comprar SAF fabricado no Brasil, reduzindo a pegada de CO₂ em até 80% por tonelada comparado ao querosene tradicional.

Além da questão ambiental, há um aspecto comercial: o preço do etanol brasileiro tem se mantido competitivo frente a outras matérias‑primas, principalmente porque o país dispõe de uma cadeia logística já testada e de políticas de apoio ao agronegócio.

Próximos passos e desafios

Próximos passos e desafios

Nos próximos meses, as equipes técnicas da Raízen e da SAFPAC vão validar a viabilidade econômica dos três estágios, levando em conta custos de transporte, tarifas de exportação e requisitos regulatórios dos aeroportos asiáticos.

Um ponto crítico ainda é a questão da confidencialidade: o MoU estabelece cláusulas de sigilo por três anos após seu término, limitando o compartilhamento de informações estratégicas a afiliadas diretas. Qualquer violação pode gerar multas severas, segundo o texto assinado.

Por fim, a comunidade científica brasileira observa que o sucesso do projeto poderá alavancar investimentos adicionais em pesquisas de biocombustíveis avançados, potencialmente abrindo portas para o desenvolvimento de hidrogênio verde e biojet fuel de segunda geração.

Perguntas Frequentes

Como a produção de SAF impacta os agricultores de cana-de-açúcar?

A demanda extra por bagacilha – subproduto da cana – gera nova fonte de renda. Estudos da Embrapa indicam que os agricultores podem receber até 15% a mais por tonelada de cana, devido ao valor agregado da segunda geração de etanol.

Qual a diferença entre SAF de primeira e segunda geração?

O SAF de primeira geração usa matérias‑primas como óleos vegetais, competindo direto com a produção de alimentos. O de segunda geração, como o proposto pelo acordo, parte da bagacilha da cana, que não entra na cadeia alimentar, reduzindo impactos sociais e aumentando a sustentabilidade.

Quando a primeira produção de SAF deverá entrar em operação?

A fase inaugural, prevista para 2025‑2026, tem meta de iniciar a produção comercial em meados de 2026, após a conclusão dos testes piloto de conversão ATJ em parceria com laboratórios chineses.

Quais são os principais desafios regulatórios para exportar SAF para a Ásia?

Cada país possui normas distintas de certificação de combustíveis. A SAFPAC está trabalhando para alinhar o produto às certificações IATA e às regras de emissão da China, o que pode envolver auditorias anuais e documentação adicional.

O acordo inclui metas de redução de emissões para o Brasil?

Sim. Segundo o Ministério de Minas e Energia, cada tonelada de SAF produzida pode diminuir cerca de 3,5 toneladas de CO₂ comparado ao combustível fóssil, contribuindo para a meta nacional de redução de 43% nas emissões do setor de transportes até 2030.